Metafísica Bíblica e Calvinismo

Metafísica Bíblica e Calvinismo

Tratarei aqui de forma direta sobre Metafísica, não necessariamente Providência, embora o termo “Causa Secundária” aqui analisado seja extraído das Confissões Reformadas (CFW e CFB).

Embora a esmagadora maioria dos Calvinistas no Brasil seja adepta do Concorrentismo Aristotélico/ Tomista, eu não compartilho desta corrente Metafísica.

O Concorrentismo basicamente é uma posição filosófica que afirma que o homem possui autonomia (em nível Metafísico), como causa secundária, para concorrer junto com a causa primária (Deus), realizando um efeito específico, em um evento.
Essa posição é a posição dos Tomistas/Calvinistas Escolásticos que por algum motivo se acham os únicos Calvinistas Ortodoxos que existem. Os mesmos ignoram as inconsistências lógicas dessa posição: A filosofia do Pagão Aristóteles, que posteriormente foi adaptada ao Cristianismo por Tomás de Aquino. A Bíblia não apresenta essa visão. Ela diz que Deus faz o quer e como quer. E isso significa que Deus é a única causa metafísica que existe. Portanto Filosofia Tomista não é sinônimo de Calvinismo. Ainda a nível introdutório é necessário esclarecer algo muito importante ateniente a Falácia de que nós adeptos do Essencialismo do Comando Divino, não somos Essencialistas como eram os Reformados Clássicos e portanto afirmamos que não existe Causa Segunda [o que implicaria uma defesa ao Panteísmo, segundo eles].

Deixo aqui a citação de um amigo meu:

"A causa secundária existe, mas ela é tão eficaz para alterar a realidade quanto o personagem de um livro altera as coisas na sua 'realidade' por isso o Salmista diz que seus dias estão escritos e determinados (SI 139.16), e José diz que "não foram vós que me enviastes, mas Deus" (Gn 45.8) em relação a Deus a causa secundária (ente) não é considerada eficaz no mundo."

Com isso, nossos críticos objetam:

“Então as Causas Secundárias são meras ilusões de Agência no Calvinismo”.

É uma objeção muito comum, portanto merece uma resposta satisfatória.

AS CAUSAS SECUNDÁRIAS SÃO MERAS ILUSÕES DE AGÊNCIA?

Gordon Clark observa que é necessário definir o que seria "Causalidade". Depois de definir Causalidade como uma causa e um efeito dentro do espaço-tempo, ele afirma o que de fato causa todas as coisas em fator último....

Ele diz:

"Em primeiro lugar, causalidade é um termo relativo. Isto é, não pode haver causa sem que haja um efeito. Dizemos que X causa Y. Omita qualquer um deles e não haverá nem causa, nem efeito. Algumas causas e efeitos podem parecer simultâneos; a rotação da Terra continua enquanto o Sol está nascendo. Mas, é claro, a Terra tinha de estar girando previamente. Da mesma forma, quando o rebatedor substituto de baseball faz um home run, está movimentando seu bastão antes de a bola começar sua trajetória sobre o muro de outdoor na área direita. Assim, quando X causa Y, esses dois eventos distintos estão separados por um intervalo de tempo. Levou uma semana ou dez dias para que o assassinato do arquiduque causasse a Primeira Guerra Mundial. A bala que o matou precedeu sua morte por talvez apenas um minuto. De qualquer modo, causa e efeito são dois eventos temporalmente distintos.
Em segundo lugar, entre o disparo da bala e a morte do arquiduque várias coisas poderiam ter acontecido, e de fato aconteceram. Sua esposa, não esperando a morte dele, sorria para a multidão na rua. Então, entre o assassinato e a invasão da Bélgica pela Alemanha, todo tipo de coisas também ocorreu na China e na Europa. Durante o intervalo, Lord Grey e o Kaiser poderiam ter evitado a guerra, e nesse caso a morte do arquiduque não teria sido a causa que foi. Certamente, historiadores insistem que a causa real da guerra foi o complexo de tratados desenvolvidos durante um período de anos. Mas isto somente aumenta o intervalo de tempo durante o qual a guerra poderia ter sido evitada. Agora, em terceiro lugar, o argumento requer alguma definição do termo «causa» . Visto que, para ser uma causa, um evento deve ter um efeito, a causa deve ser um evento que garanta o efeito. Dada uma causa, deve haver um efeito. Deve porque a causa deve produzir seu resultado. Se no intervalo de tempo acontece ou mesmo poderia acontecer algo para impedir o efeito, não há causa.
Para concluir, em quarto lugar, é sempre possível que durante o intervalo de tempo um evento impeça aquele evento, que foi previamente chamado de efeito, de ocorrer. Lord Grey é um exemplo. A bola de baseball poderia se partir ao meio. Ou, se sugerirmos que o alimento é a causa da nutrição, quem come pode vomitar se ocorrer de estar rebatendo no campo de baseball. Ou, no contexto do século XX, uma bomba atômica poderia interferir. E quanto ao nascer-do-sol, que o oponente rapidamente menciona, nossa Estrela poderia explodir ou a Terra, desintegrar. Se o oponente é um cristão verdadeiro, terá de admitir a possibilidade de que Deus possa destruir no intervalo os céus e a Terra com fogo ardente, deixando de existir.
Se esse argumento não fizer o apologista dar o braço a torcer, ele provavelmente virá com duas objeções. Primeiro, mas ilogicamente, ele dirá: "Mas eu quis dizer que X causa Y se nada intervir". Dito assim, sem rodeios, a falácia é flagrante. No entanto, ela pode ser declarada mais veladamente. O alimento nos nutre se não sentimos enjoo, se o estômago termina sua função, se os sucos são absorvidos no sangue e se o sangue é levado aos músculos. Mas note bem: nós não temos mais dois eventos, X e Y. Temos a definição de nutrição; e certamente é lógico insistir que se estamos nutridos, segue-se logicamente, mas não temporalmente, que estamos nutrimos. A segunda réplica que o apologista provavelmente dará é que um cristão como eu deve reconhecer que Deus causa todas as coisas. De fato, isso é algo que eu certamente reconcheceria mas o significado do termo causa foi drasticamente mudado, Nós começamos falando sobre dois eventos no mundo espaço-temporal: o rebatedor causou ou fez a bola passar por cima do muro, mastigar comida na boca causa a nutrição, uma bala causou a morte do arquiduque. Mas agora o apologista empírico começa a falar de Deus causando todas as coisas.
Concordamos agora com o anti-aristotélico islâmico Al Gazali: Deus e somente Deus é a causa, pois somente Deus pode garantir a ocorrência de Y e, de fato, de X também. Até mesmo os Divinos de Westminster concordam timidamente, pois depois de afirmar que Deus preordena tudo o que acontece, e que 'nenhum dos seus propósitos pode ser frustrado' (Jó 42: 2), eles acrescentam: “Embora... todas as coisas acontecem imutável e infalivelmente, contudo, pela mesma providência, Deus ordena que elas sucedam conforme a natureza das causas secundárias...”. O que eles chamam de causas secundárias, Malebranche tinha chamado de ocasiões. Mas uma ocasião não é um fiat lux, nem uma equação diferencial.”.¹

Portanto, Deus é Atemporal e não precisa de uma causa anterior para realizar um efeito. Por isso Deus é a causa de todas as coisas. As Causas secundárias existem, mas são meras ocasiões pelas quais os efeitos são realizados, negar isso é cair em um dualismo metafísico e/ou abraçar uma metafísica pagã. Por que? Porque só Deus sustenta o evento (causando tanto efeito X quanto o efeito Y). Por isso alguns Teólogos usam termos como “Causa Aparente”, ou “Causa Mecânica”, para deixar claro que não usam o termo “Causa Segunda” no mesmo sentido que Concorrentistas usam.

Resumindo:

No Concorrentismo Causas Secundárias são meios que Deus (A Causa Primária) usa para realizar seus Decretos. Deus sempre move a criatura a fazer algo ou sempre remove pensamentos e ações para que a criatura continue agindo de acordo com a própria natureza dela.

Ex: A Causa Primária (ou Metafísica) move a causa secundária para realizar um evento resultando em uma causa total.

No Essencialismo do Comando Divino: As Causas Secundárias existem mas são meras ocasiões pelas quais os efeitos são realizados.

Ex: Deus Causa X e Y, ou seja ocasiona (e sustenta de forma exaustiva) tanto o efeito quanto o evento.

Portanto as Causas Secundárias são Causas Aparentes ou Mecânicas. Tanto que a CFW, em seu Capítulo V, Artigo III diz:

"Na sua providência ordinária Deus emprega meios; todavia, ele é livre para operar sem eles, sobre eles ou contra eles, segundo o seu arbítrio.

At. 27:24, 31; Isa. 55:10-11; Os.1:7; Rom. 4:20-21; Dan.3:27; João 11:34-45; Rom. 1:4."

Falando diretamente contra o Concorrentismo defendido por Calvinistas Escolásticos, Molinistas e Arminianos, um certo teólogo afirma:

"A Metafísica aristotélica é fracassada por depender dos elementos criados ou criaturas como causa secundária, no sentido em que, eles possuem uma eficiência ou "dão forma" ao ato pecaminoso. Em contra partida uma das explicações mais elevada de Metafísica na Bíblia está em Romanos 9. Ali o apóstolo nos desenha a imagem de um oleiro mestre fazendo vasos, as propriedades que os vasos têm procedem das mãos do próprio oleiro, o vaso de barro não faz uma alça em si mesmo. Ele reconhece que todas as suas características vieram diretamente da mão do oleiro e por isso retruca "por que me fizeste assim?" (20-21). A resposta do apóstolo não é apelar para uma suposta liberdade da criatura em relação metafísica ao Oleiro mestre, muito menos o apóstolo atribui ao vaso alguma causa secundária, visto que a analogia aqui torna isso impossível. Antes, o apóstolo apela para a autoridade e o direito do oleiro de fazer o que quiser
com o que ė dele.²

Esclarecido isso surge outra objeção…

MAS ESSA DEFINIÇÃO DE CAUSA METAFÍSICA NÃO FAZ DE DEUS O AUTOR DO MAL?

Isso não faz o menor sentido. A menos que se questione isso partindo do pressuposto de que os que objetam contra o Calvinismo acreditam que quem causa o Mal (metafísicamente) é um deus menor chamado Demiurgo que vive em uma eterna queda de braço com o Deus da Bíblia. Ou possuem uma definição errada (Tomista) de pecado. Portanto, é necessário definirmos biblicamente o que é Pecado.

Transgressão na Bíblia é quebrar um preceito Divino. É transgredir a Lei que Deus estabeleceu (Romanos 4:15,16). Logo, devemos separar Metafísica de Ética. Causar não é tentar, muito menos pecar. Seria absurdo afirmar que Deus pecou quando causou a queda de Adão, tal como seria absurdo afirmar que Deus é responsável (no sentido de ser o Agente que comete o pecado), tal como seria absurdo afirmar que Deus não causou a queda. Uma vez que a Escritura ensina que Deus faz literalmente todas as coisas [παντα] (Efésios 1:11).

Obviamente, isso é claramente ensinado pelas Escrituras Sagradas:

"No céu está o nosso Deus e tudo FAZ COMO LHE AGRADA." (SI 115.3).

"Assim como tu não sabes qual o caminho do vento, nem como se formam os ossos no ventre da mulher grávida, assim também não sabes as obras de Deus, que FAZ TODAS AS COISAS." (Ec 11.5).

"nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que FAZ TODAS AS COISAS conforme o conselho da sua vontade," (Ef 1.11).

Portanto, ao separarmos Metafísica de Ética, não vamos de encontro com as Confissões Reformadas e Símbolos de Fé das Igrejas Reformadas (CFW, CFB e Cânones de Dort quando eles afirmam que Deus não é o Autor do pecado), ao mesmo tempo em que não partimos dos mesmos pressupostos essencialmente pagãos de nossos amigos Aristotélicos.

Metafisica - Deus determinou que Faraó endurecesse seu coração (Ex 10.1-2).

Ética - Deus responsabiliza faraó por isso (Ex 10.3).

Metafísica - Deus faz o impio para o dia da calamidade (Pv 16.4).
Ética - Deus pune os impios com o inferno (SI 9.17).

Metafísica - Deus fez o Vaso de ira para a destruição (Rm 9).
Ética - Deus pune o vaso de ira no inferno (Rm 9).

Metafísica - Deus coloca no coração dos reis da terra que cumpram o seu intento - Ap 17.17. Ética - Deus lança todos os reis da terra com Satanás no Inferno (Ap 20,10,15).

Metafísica — Deus faz vasos para a perdição (Rm 9:16;18;21,22).

Ética —Deus ordena que os ímpios se arrependam (Ez 33:11; Rm 9;19;22).

Embora eu seja adepto do Escrituralismo (ou Dogmatismo) de Gordon Clark, outros Teólogos que não são Confessionais já escreveram sobre o significado que Tomistas dão às Causas Secundárias encontradas nas Confissões Reformadas, e até agora não foram respondidos:

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Não há contradição alguma, Deus é Soberano e você é responsável, isso não é uma invenção de Lutero, Calvino, Malebranche, Edwards ou Gordon Clark, isso é o que a Bíblia diz. Sola Scriptura.

Referências:

1- Gordon H. Clark, Senhor Deus da Verdade, Hobbs, NM: The Trinity Foundation, 1986, 2ª Edição 1994, 24-25, 27.

2- Yuri Andrei Schein, Teologia Sistemática Pressuposicional Volume 1, 2020, 217.