Simplificando o Whitepaper do Bitcoin

Simplificando o Whitepaper do Bitcoin

Bitcoin: Um sistema de dinheiro eletrônico direto entre pessoas.

Satoshi Nakamoto
satoshin@gmx.com
www.bitcoin.org


Resumo

O Bitcoin é uma forma de dinheiro digital que permite pagamentos diretos entre pessoas, sem a necessidade de um banco ou instituição financeira. Ele resolve um problema chamado gasto duplo, que ocorre quando alguém tenta gastar o mesmo dinheiro duas vezes. Para evitar isso, o Bitcoin usa uma rede descentralizada onde todos trabalham juntos para verificar e registrar as transações.

As transações são registradas em um livro público chamado blockchain, protegido por uma técnica chamada Prova de Trabalho. Essa técnica cria uma cadeia de registros que não pode ser alterada sem refazer todo o trabalho já feito. Essa cadeia é mantida pelos computadores que participam da rede, e a mais longa é considerada a verdadeira.

Enquanto a maior parte do poder computacional da rede for controlada por participantes honestos, o sistema continuará funcionando de forma segura. A rede é flexível, permitindo que qualquer pessoa entre ou saia a qualquer momento, sempre confiando na cadeia mais longa como prova do que aconteceu.


1. Introdução

Hoje, quase todos os pagamentos feitos pela internet dependem de bancos ou empresas como processadores de pagamento (cartões de crédito, por exemplo) para funcionar. Embora esse sistema seja útil, ele tem problemas importantes porque é baseado em confiança.

Primeiro, essas empresas podem reverter pagamentos, o que é útil em caso de erros, mas cria custos e incertezas. Isso faz com que pequenas transações, como pagar centavos por um serviço, se tornem inviáveis. Além disso, os comerciantes são obrigados a desconfiar dos clientes, pedindo informações extras e aceitando fraudes como algo inevitável.

Esses problemas não existem no dinheiro físico, como o papel-moeda, onde o pagamento é final e direto entre as partes. No entanto, não temos como enviar dinheiro físico pela internet sem depender de um intermediário confiável.

O que precisamos é de um sistema de pagamento eletrônico baseado em provas matemáticas, não em confiança. Esse sistema permitiria que qualquer pessoa enviasse dinheiro diretamente para outra, sem depender de bancos ou processadores de pagamento. Além disso, as transações seriam irreversíveis, protegendo vendedores contra fraudes, mas mantendo a possibilidade de soluções para disputas legítimas.

Neste documento, apresentamos o Bitcoin, que resolve o problema do gasto duplo usando uma rede descentralizada. Essa rede cria um registro público e protegido por cálculos matemáticos, que garante a ordem das transações. Enquanto a maior parte da rede for controlada por pessoas honestas, o sistema será seguro contra ataques.


2. Transações

Para entender como funciona o Bitcoin, é importante saber como as transações são realizadas. Imagine que você quer transferir uma "moeda digital" para outra pessoa. No sistema do Bitcoin, essa "moeda" é representada por uma sequência de registros que mostram quem é o atual dono. Para transferi-la, você adiciona um novo registro comprovando que agora ela pertence ao próximo dono. Esse registro é protegido por um tipo especial de assinatura digital.

O que é uma assinatura digital?

Uma assinatura digital é como uma senha secreta, mas muito mais segura. No Bitcoin, cada usuário tem duas chaves: uma "chave privada", que é secreta e serve para criar a assinatura, e uma "chave pública", que pode ser compartilhada com todos e é usada para verificar se a assinatura é válida. Quando você transfere uma moeda, usa sua chave privada para assinar a transação, provando que você é o dono. A próxima pessoa pode usar sua chave pública para confirmar isso.

Como funciona na prática?

Cada "moeda" no Bitcoin é, na verdade, uma cadeia de assinaturas digitais. Vamos imaginar o seguinte cenário:

  1. A moeda está com o Dono 0 (você). Para transferi-la ao Dono 1, você assina digitalmente a transação com sua chave privada. Essa assinatura inclui o código da transação anterior (chamado de "hash") e a chave pública do Dono 1.
  2. Quando o Dono 1 quiser transferir a moeda ao Dono 2, ele assinará a transação seguinte com sua própria chave privada, incluindo também o hash da transação anterior e a chave pública do Dono 2.
  3. Esse processo continua, formando uma "cadeia" de transações. Qualquer pessoa pode verificar essa cadeia para confirmar quem é o atual dono da moeda.

Resolvendo o problema do gasto duplo

Um grande desafio com moedas digitais é o "gasto duplo", que é quando uma mesma moeda é usada em mais de uma transação. Para evitar isso, muitos sistemas antigos dependiam de uma entidade central confiável, como uma casa da moeda, que verificava todas as transações. No entanto, isso criava um ponto único de falha e centralizava o controle do dinheiro.

O Bitcoin resolve esse problema de forma inovadora: ele usa uma rede descentralizada onde todos os participantes (os "nós") têm acesso a um registro completo de todas as transações. Cada nó verifica se as transações são válidas e se a moeda não foi gasta duas vezes. Quando a maioria dos nós concorda com a validade de uma transação, ela é registrada permanentemente na blockchain.

Por que isso é importante?

Essa solução elimina a necessidade de confiar em uma única entidade para gerenciar o dinheiro, permitindo que qualquer pessoa no mundo use o Bitcoin sem precisar de permissão de terceiros. Além disso, ela garante que o sistema seja seguro e resistente a fraudes.


3. Servidor Timestamp

Para assegurar que as transações sejam realizadas de forma segura e transparente, o sistema Bitcoin utiliza algo chamado de "servidor de registro de tempo" (timestamp). Esse servidor funciona como um registro público que organiza as transações em uma ordem específica.

Ele faz isso agrupando várias transações em blocos e criando um código único chamado "hash". Esse hash é como uma impressão digital que representa todo o conteúdo do bloco. O hash de cada bloco é amplamente divulgado, como se fosse publicado em um jornal ou em um fórum público.

Esse processo garante que cada bloco de transações tenha um registro de quando foi criado e que ele existia naquele momento. Além disso, cada novo bloco criado contém o hash do bloco anterior, formando uma cadeia contínua de blocos conectados — conhecida como blockchain.

Com isso, se alguém tentar alterar qualquer informação em um bloco anterior, o hash desse bloco mudará e não corresponderá ao hash armazenado no bloco seguinte. Essa característica torna a cadeia muito segura, pois qualquer tentativa de fraude seria imediatamente detectada.

O sistema de timestamps é essencial para provar a ordem cronológica das transações e garantir que cada uma delas seja única e autêntica. Dessa forma, ele reforça a segurança e a confiança na rede Bitcoin.


4. Prova-de-Trabalho

Para implementar o registro de tempo distribuído no sistema Bitcoin, utilizamos um mecanismo chamado prova-de-trabalho. Esse sistema é semelhante ao Hashcash, desenvolvido por Adam Back, e baseia-se na criação de um código único, o "hash", por meio de um processo computacionalmente exigente.

A prova-de-trabalho envolve encontrar um valor especial que, quando processado junto com as informações do bloco, gere um hash que comece com uma quantidade específica de zeros. Esse valor especial é chamado de "nonce". Encontrar o nonce correto exige um esforço significativo do computador, porque envolve tentativas repetidas até que a condição seja satisfeita.

Esse processo é importante porque torna extremamente difícil alterar qualquer informação registrada em um bloco. Se alguém tentar mudar algo em um bloco, seria necessário refazer o trabalho de computação não apenas para aquele bloco, mas também para todos os blocos que vêm depois dele. Isso garante a segurança e a imutabilidade da blockchain.

A prova-de-trabalho também resolve o problema de decidir qual cadeia de blocos é a válida quando há múltiplas cadeias competindo. A decisão é feita pela cadeia mais longa, pois ela representa o maior esforço computacional já realizado. Isso impede que qualquer indivíduo ou grupo controle a rede, desde que a maioria do poder de processamento seja mantida por participantes honestos.

Para garantir que o sistema permaneça eficiente e equilibrado, a dificuldade da prova-de-trabalho é ajustada automaticamente ao longo do tempo. Se novos blocos estiverem sendo gerados rapidamente, a dificuldade aumenta; se estiverem sendo gerados muito lentamente, a dificuldade diminui. Esse ajuste assegura que novos blocos sejam criados aproximadamente a cada 10 minutos, mantendo o sistema estável e funcional.


5. Rede

A rede Bitcoin é o coração do sistema e funciona de maneira distribuída, conectando vários participantes (ou nós) para garantir o registro e a validação das transações. Os passos para operar essa rede são:

  1. Transmissão de Transações: Quando alguém realiza uma nova transação, ela é enviada para todos os nós da rede. Isso é feito para garantir que todos estejam cientes da operação e possam validá-la.

  2. Coleta de Transações em Blocos: Cada nó agrupa as novas transações recebidas em um "bloco". Este bloco será preparado para ser adicionado à cadeia de blocos (a blockchain).

  3. Prova-de-Trabalho: Os nós competem para resolver a prova-de-trabalho do bloco, utilizando poder computacional para encontrar um hash válido. Esse processo é como resolver um quebra-cabeça matemático difícil.

  4. Envio do Bloco Resolvido: Quando um nó encontra a solução para o bloco (a prova-de-trabalho), ele compartilha esse bloco com todos os outros nós na rede.

  5. Validação do Bloco: Cada nó verifica o bloco recebido para garantir que todas as transações nele contidas sejam válidas e que nenhuma moeda tenha sido gasta duas vezes. Apenas blocos válidos são aceitos.

  6. Construção do Próximo Bloco: Os nós que aceitaram o bloco começam a trabalhar na criação do próximo bloco, utilizando o hash do bloco aceito como base (hash anterior). Isso mantém a continuidade da cadeia.

Resolução de Conflitos e Escolha da Cadeia Mais Longa

Os nós sempre priorizam a cadeia mais longa, pois ela representa o maior esforço computacional já realizado, garantindo maior segurança. Se dois blocos diferentes forem compartilhados simultaneamente, os nós trabalharão no primeiro bloco recebido, mas guardarão o outro como uma alternativa. Caso o segundo bloco eventualmente forme uma cadeia mais longa (ou seja, tenha mais blocos subsequentes), os nós mudarão para essa nova cadeia.

Tolerância a Falhas

A rede é robusta e pode lidar com mensagens que não chegam a todos os nós. Uma transação não precisa alcançar todos os nós de imediato; basta que chegue a um número suficiente deles para ser incluída em um bloco. Da mesma forma, se um nó não receber um bloco em tempo hábil, ele pode solicitá-lo ao perceber que está faltando quando o próximo bloco é recebido.

Esse mecanismo descentralizado permite que a rede Bitcoin funcione de maneira segura, confiável e resiliente, sem depender de uma autoridade central.


6. Incentivo

O incentivo é um dos pilares fundamentais que sustenta o funcionamento da rede Bitcoin, garantindo que os participantes (nós) continuem operando de forma honesta e contribuindo com recursos computacionais. Ele é estruturado em duas partes principais: a recompensa por mineração e as taxas de transação.

Recompensa por Mineração

Por convenção, o primeiro registro em cada bloco é uma transação especial que cria novas moedas e as atribui ao criador do bloco. Essa recompensa incentiva os mineradores a dedicarem poder computacional para apoiar a rede. Como não há uma autoridade central para emitir moedas, essa é a maneira pela qual novas moedas entram em circulação. Esse processo pode ser comparado ao trabalho de garimpeiros, que utilizam recursos para colocar mais ouro em circulação. No caso do Bitcoin, o "recurso" consiste no tempo de CPU e na energia elétrica consumida para resolver a prova-de-trabalho.

Taxas de Transação

Além da recompensa por mineração, os mineradores também podem ser incentivados pelas taxas de transação. Se uma transação utiliza menos valor de saída do que o valor de entrada, a diferença é tratada como uma taxa, que é adicionada à recompensa do bloco contendo essa transação. Com o passar do tempo e à medida que o número de moedas em circulação atinge o limite predeterminado, essas taxas de transação se tornam a principal fonte de incentivo, substituindo gradualmente a emissão de novas moedas. Isso permite que o sistema opere sem inflação, uma vez que o número total de moedas permanece fixo.

Incentivo à Honestidade

O design do incentivo também busca garantir que os participantes da rede mantenham um comportamento honesto. Para um atacante que consiga reunir mais poder computacional do que o restante da rede, ele enfrentaria duas escolhas:

  1. Usar esse poder para fraudar o sistema, como reverter transações e roubar pagamentos.
  2. Seguir as regras do sistema, criando novos blocos e recebendo recompensas legítimas.

A lógica econômica favorece a segunda opção, pois um comportamento desonesto prejudicaria a confiança no sistema, diminuindo o valor de todas as moedas, incluindo aquelas que o próprio atacante possui. Jogar dentro das regras não apenas maximiza o retorno financeiro, mas também preserva a validade e a integridade do sistema.

Esse mecanismo garante que os incentivos econômicos estejam alinhados com o objetivo de manter a rede segura, descentralizada e funcional ao longo do tempo.


7. Recuperação do Espaço em Disco

Depois que uma moeda passa a estar protegida por muitos blocos na cadeia, as informações sobre as transações antigas que a geraram podem ser descartadas para economizar espaço em disco. Para que isso seja possível sem comprometer a segurança, as transações são organizadas em uma estrutura chamada "árvore de Merkle". Essa árvore funciona como um resumo das transações: em vez de armazenar todas elas, guarda apenas um "hash raiz", que é como uma assinatura compacta que representa todo o grupo de transações.

Os blocos antigos podem, então, ser simplificados, removendo as partes desnecessárias dessa árvore. Apenas a raiz do hash precisa ser mantida no cabeçalho do bloco, garantindo que a integridade dos dados seja preservada, mesmo que detalhes específicos sejam descartados.

Para exemplificar: imagine que você tenha vários recibos de compra. Em vez de guardar todos os recibos, você cria um documento e lista apenas o valor total de cada um. Mesmo que os recibos originais sejam descartados, ainda é possível verificar a soma com base nos valores armazenados.

Além disso, o espaço ocupado pelos blocos em si é muito pequeno. Cada bloco sem transações ocupa apenas cerca de 80 bytes. Isso significa que, mesmo com blocos sendo gerados a cada 10 minutos, o crescimento anual em espaço necessário é insignificante: apenas 4,2 MB por ano. Com a capacidade de armazenamento dos computadores crescendo a cada ano, esse espaço continuará sendo trivial, garantindo que a rede possa operar de forma eficiente sem problemas de armazenamento, mesmo a longo prazo.


8. Verificação de Pagamento Simplificada

É possível confirmar pagamentos sem a necessidade de operar um nó completo da rede. Para isso, o usuário precisa apenas de uma cópia dos cabeçalhos dos blocos da cadeia mais longa (ou seja, a cadeia com maior esforço de trabalho acumulado). Ele pode verificar a validade de uma transação ao consultar os nós da rede até obter a confirmação de que tem a cadeia mais longa. Para isso, utiliza-se o ramo Merkle, que conecta a transação ao bloco em que ela foi registrada.

Entretanto, o método simplificado possui limitações: ele não pode confirmar uma transação isoladamente, mas sim assegurar que ela ocupa um lugar específico na cadeia mais longa. Dessa forma, se um nó da rede aprova a transação, os blocos subsequentes reforçam essa aceitação.

A verificação simplificada é confiável enquanto a maioria dos nós da rede for honesta. Contudo, ela se torna vulnerável caso a rede seja dominada por um invasor. Nesse cenário, um atacante poderia fabricar transações fraudulentas que enganariam o usuário temporariamente até que o invasor obtivesse controle completo da rede.

Uma estratégia para mitigar esse risco é configurar alertas nos softwares de nós completos. Esses alertas identificam blocos inválidos, sugerindo ao usuário baixar o bloco completo para confirmar qualquer inconsistência. Para maior segurança, empresas que realizam pagamentos frequentes podem preferir operar seus próprios nós, reduzindo riscos e permitindo uma verificação mais direta e confiável.


9. Combinando e Dividindo Valor

No sistema Bitcoin, cada unidade de valor é tratada como uma "moeda" individual, mas gerenciar cada centavo como uma transação separada seria impraticável. Para resolver isso, o Bitcoin permite que valores sejam combinados ou divididos em transações, facilitando pagamentos de qualquer valor.

Entradas e Saídas

Cada transação no Bitcoin é composta por:

  • Entradas: Representam os valores recebidos em transações anteriores.
  • Saídas: Correspondem aos valores enviados, divididos entre os destinatários e, eventualmente, o troco para o remetente.

Normalmente, uma transação contém:

  • Uma única entrada com valor suficiente para cobrir o pagamento.
  • Ou várias entradas combinadas para atingir o valor necessário.

O valor total das saídas nunca excede o das entradas, e a diferença (se houver) pode ser retornada ao remetente como troco.

Exemplo Prático

Imagine que você tem duas entradas:

  1. 0,03 BTC
  2. 0,07 BTC

Se deseja enviar 0,08 BTC para alguém, a transação terá:

  • Entrada: As duas entradas combinadas (0,03 + 0,07 BTC = 0,10 BTC).
  • Saídas: Uma para o destinatário (0,08 BTC) e outra como troco para você (0,02 BTC).

Essa flexibilidade permite que o sistema funcione sem precisar manipular cada unidade mínima individualmente.

Difusão e Simplificação

A difusão de transações, onde uma depende de várias anteriores e assim por diante, não representa um problema. Não é necessário armazenar ou verificar o histórico completo de uma transação para utilizá-la, já que o registro na blockchain garante sua integridade.


10. Privacidade

O modelo bancário tradicional oferece um certo nível de privacidade, limitando o acesso às informações financeiras apenas às partes envolvidas e a um terceiro confiável (como bancos ou instituições financeiras). No entanto, o Bitcoin opera de forma diferente, pois todas as transações são publicamente registradas na blockchain. Apesar disso, a privacidade pode ser mantida utilizando chaves públicas anônimas, que desvinculam diretamente as transações das identidades das partes envolvidas.

Fluxo de Informação

  • No modelo tradicional, as transações passam por um terceiro confiável que conhece tanto o remetente quanto o destinatário.
  • No Bitcoin, as transações são anunciadas publicamente, mas sem revelar diretamente as identidades das partes. Isso é comparável a dados divulgados por bolsas de valores, onde informações como o tempo e o tamanho das negociações (a "fita") são públicas, mas as identidades das partes não.

Protegendo a Privacidade

Para aumentar a privacidade no Bitcoin, são adotadas as seguintes práticas:

  1. Chaves Públicas Anônimas: Cada transação utiliza um par de chaves diferentes, dificultando a associação com um proprietário único.
  2. Prevenção de Ligação: Ao usar chaves novas para cada transação, reduz-se a possibilidade de links evidentes entre múltiplas transações realizadas pelo mesmo usuário.

Riscos de Ligação

Embora a privacidade seja fortalecida, alguns riscos permanecem:

  • Transações multi-entrada podem revelar que todas as entradas pertencem ao mesmo proprietário, caso sejam necessárias para somar o valor total.
  • O proprietário da chave pode ser identificado indiretamente por transações anteriores que estejam conectadas.

11. Cálculos

Imagine que temos um sistema onde as pessoas (ou computadores) competem para adicionar informações novas (blocos) a um grande registro público (a cadeia de blocos ou blockchain). Este registro é como um livro contábil compartilhado, onde todos podem verificar o que está escrito.

Agora, vamos pensar em um cenário: um atacante quer enganar o sistema. Ele quer mudar informações já registradas para beneficiar a si mesmo, por exemplo, desfazendo um pagamento que já fez. Para isso, ele precisa criar uma versão alternativa do livro contábil (a cadeia de blocos dele) e convencer todos os outros participantes de que essa versão é a verdadeira.

Mas isso é extremamente difícil.

Como o Ataque Funciona

Quando um novo bloco é adicionado à cadeia, ele depende de cálculos complexos que levam tempo e esforço. Esses cálculos são como um grande quebra-cabeça que precisa ser resolvido.

  • Os “bons jogadores” (nós honestos) estão sempre trabalhando juntos para resolver esses quebra-cabeças e adicionar novos blocos à cadeia verdadeira.
  • O atacante, por outro lado, precisa resolver quebra-cabeças sozinho, tentando “alcançar” a cadeia honesta para que sua versão alternativa pareça válida.

Se a cadeia honesta já está vários blocos à frente, o atacante começa em desvantagem, e o sistema está projetado para que a dificuldade de alcançá-los aumente rapidamente.

A Corrida Entre Cadeias

Você pode imaginar isso como uma corrida. A cada bloco novo que os jogadores honestos adicionam à cadeia verdadeira, eles se distanciam mais do atacante. Para vencer, o atacante teria que resolver os quebra-cabeças mais rápido que todos os outros jogadores honestos juntos.

Suponha que:

  • A rede honesta tem 80% do poder computacional (ou seja, resolve 8 de cada 10 quebra-cabeças).
  • O atacante tem 20% do poder computacional (ou seja, resolve 2 de cada 10 quebra-cabeças).

Cada vez que a rede honesta adiciona um bloco, o atacante tem que "correr atrás" e resolver mais quebra-cabeças para alcançar.

Por Que o Ataque Fica Cada Vez Mais Improvável

Vamos usar uma fórmula simples para mostrar como as chances de sucesso do atacante diminuem conforme ele precisa "alcançar" mais blocos:

P = (q/p)^z

  • q é o poder computacional do atacante (20%, ou 0,2).
  • p é o poder computacional da rede honesta (80%, ou 0,8).
  • z é a diferença de blocos entre a cadeia honesta e a cadeia do atacante.

Se o atacante está 5 blocos atrás (z = 5):

P = (0,2 / 0,8)^5 = (0,25)^5 = 0,00098, (ou, 0,098%)

Isso significa que o atacante tem menos de 0,1% de chance de sucesso — ou seja, é muito improvável.

Se ele estiver 10 blocos atrás (z = 10):

P = (0,2 / 0,8)^10 = (0,25)^10 = 0,000000095, (ou, 0,0000095%).

Neste caso, as chances de sucesso são praticamente nulas.

Um Exemplo Simples

Se você jogar uma moeda, a chance de cair “cara” é de 50%. Mas se precisar de 10 caras seguidas, sua chance já é bem menor. Se precisar de 20 caras seguidas, é quase impossível.

No caso do Bitcoin, o atacante precisa de muito mais do que 20 caras seguidas. Ele precisa resolver quebra-cabeças extremamente difíceis e alcançar os jogadores honestos que estão sempre à frente. Isso faz com que o ataque seja inviável na prática.

Por Que Tudo Isso é Seguro?

  • A probabilidade de sucesso do atacante diminui exponencialmente. Isso significa que, quanto mais tempo passa, menor é a chance de ele conseguir enganar o sistema.
  • A cadeia verdadeira (honesta) está protegida pela força da rede. Cada novo bloco que os jogadores honestos adicionam à cadeia torna mais difícil para o atacante alcançar.

E Se o Atacante Tentar Continuar?

O atacante poderia continuar tentando indefinidamente, mas ele estaria gastando muito tempo e energia sem conseguir nada. Enquanto isso, os jogadores honestos estão sempre adicionando novos blocos, tornando o trabalho do atacante ainda mais inútil.

Assim, o sistema garante que a cadeia verdadeira seja extremamente segura e que ataques sejam, na prática, impossíveis de ter sucesso.


12. Conclusão

Propusemos um sistema de transações eletrônicas que elimina a necessidade de confiança, baseando-se em assinaturas digitais e em uma rede peer-to-peer que utiliza prova de trabalho. Isso resolve o problema do gasto duplo, criando um histórico público de transações imutável, desde que a maioria do poder computacional permaneça sob controle dos participantes honestos.
A rede funciona de forma simples e descentralizada, com nós independentes que não precisam de identificação ou coordenação direta. Eles entram e saem livremente, aceitando a cadeia de prova de trabalho como registro do que ocorreu durante sua ausência. As decisões são tomadas por meio do poder de CPU, validando blocos legítimos, estendendo a cadeia e rejeitando os inválidos.
Com este mecanismo de consenso, todas as regras e incentivos necessários para o funcionamento seguro e eficiente do sistema são garantidos.


Faça o download do whitepaper original em português:
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